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Terça-feira, 13 de Maio de 2025

Brasil

Estudo revela os riscos do uso de reconhecimento facial

Em certos casos, os sistemas apresentam taxas de erro significativamente mais altas entre grupos populacionais como negros, indígenas e asiáticos.

Quentuchas Notícias
Por Quentuchas Notícias
Estudo revela os riscos do uso de reconhecimento facial
© Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Seu rosto pode estar sendo filmado, analisado e identificado sem que você saiba. É o que revela o relatório Mapeando a Vigilância Biométrica, divulgado nesta quarta-feira (7) pela Defensoria Pública da União (DPU) em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Candido Mendes (RJ). A pesquisa mostra o avanço acelerado das tecnologias de reconhecimento facial (TRFs) no Brasil, especialmente após os megaeventos como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.

Segundo o levantamento, até abril de 2025, existiam pelo menos 376 projetos de reconhecimento facial ativos no país, com capacidade de monitorar quase 83 milhões de pessoas — cerca de 40% da população brasileira. O investimento público já soma mais de R$ 160 milhões, valor calculado com base nos dados de 23 das 27 unidades da federação.

Mesmo diante desse cenário, o Brasil ainda não possui uma legislação específica para regulamentar o uso dessas tecnologias, apontam os pesquisadores. Além disso, faltam transparência, mecanismos de controle externo e protocolos técnicos padronizados, o que aumenta o risco de violações de direitos, discriminação e uso indevido de recursos públicos.

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Erros e discriminação

O estudo destaca falhas já registradas em 24 casos entre 2019 e abril de 2025, incluindo o episódio envolvendo o personal trainer João Antônio Trindade Bastos, 23 anos, confundido com um foragido durante um jogo de futebol em Aracaju (SE), em 2024. Ele foi abordado por policiais militares e revistado de forma agressiva antes de provar sua identidade. Bastos é negro, e o caso gerou ampla repercussão, levando o governo de Sergipe a suspender o uso da tecnologia pela Polícia Militar.

O relatório aponta que mais da metade das abordagens feitas com base em reconhecimento facial no Brasil resultaram em identificações erradas. Há evidências de que o sistema é mais propenso a erros quando se trata de pessoas negras, indígenas e asiáticas. Pesquisas internacionais citadas pelo estudo mostram que as taxas de erro podem ser de 10 a 100 vezes maiores nesses grupos, em comparação com pessoas brancas.

Em 2021, o Parlamento Europeu já havia alertado que as falhas técnicas em sistemas de identificação biométrica por inteligência artificial podem levar a resultados enviesados e discriminação.

Projeto de lei e debate público

O relatório também analisa o Projeto de Lei nº 2338/2023, aprovado pelo Senado em dezembro de 2024, que pretende regulamentar o uso da inteligência artificial no Brasil. O texto, no entanto, traz exceções amplas — como uso em investigações criminais, flagrantes, busca de desaparecidos e recaptura de foragidos —, o que, segundo os especialistas, pode abrir caminho para a vigilância generalizada.

Os autores do estudo defendem a urgência de um debate público qualificado, com participação da sociedade civil, academia e órgãos de controle. Entre as recomendações estão:

  • Criação de uma lei nacional específica para o uso de reconhecimento facial;

  • Padronização de protocolos técnicos e operacionais;

  • Realização de auditorias independentes e regulares;

  • Transparência nos contratos e nas bases de dados utilizadas pelos órgãos públicos;

  • Capacitação dos agentes públicos envolvidos;

  • Exigência de autorização judicial prévia para o uso das informações em investigações;

  • Limitação do tempo de armazenamento dos dados biométricos;

  • Fortalecimento da fiscalização sobre empresas privadas que operam essas tecnologias.

“O relatório evidencia tanto os vieses raciais no uso da tecnologia quanto problemas de mau uso de recursos públicos e falta de transparência na sua implementação”, afirmou Pablo Nunes, coordenador-geral do CESeC.

FONTE/CRÉDITOS: Redação / Agência Brasil